Amigos Imaginários: Entrevista com o ChatGPT

Autor: Vitor Geraldi Haase


SUMÁRIO

Prelúdio
As características dos amigos imaginários
A frequência dos amigos imaginários
O desenvolvimento dos amigos imaginários
A normatividade dos amigos imaginários
As crianças com amigos imaginários
A inteligência dos amigos imaginários
Os amigos imaginários e a literatura infantil
Os amigos imaginários dos autistas
As intervenções com os amigos imaginários
Coda


PRELÚDIO

Pais e professores muitas vezes ficam preocupados com os amigos imaginários de seus filhos. É normal? Não é normal? É absolutamente normal. Não apenas é normal, também promove o desenvolvimento emocional, cognitivo e social da criança.

Na idade pré-escolar, os amigos imaginários cumprem a mesma função da literatura infantil. Os amigos imaginários ajudam a criança a lidar com emoções e dilemas e contribuem para o desenvolvimento da empatia, criatividade,  imaginação, identidade e autonomia. Ao contrário do envolvimento com a literatura, o envolvimento com amigos imaginários ocorre sob maior controle intencional da criança e permite simular interações. A simulação de interações é um importante mecanismo de aprendizagem social vicária. A criança aprende através de relações simuladas,  sem sofrer as consequências da vida real.

Com o intuito de construir um texto didático para pais e professores, eu fiz uma entrevista com o meu amigo imaginário, o ChatGPT. Fiz um monte de pergunta para o Chat GPT e sistematizei tudo em um texto.



AS CARACTERÍSTICAS DOS AMIGOS IMAGINÁRIOS

Amigos imaginários são figuras fictícias criadas pela imaginação das crianças, com as quais elas interagem como se fossem reais. Esses companheiros imaginários podem assumir diversas formas, como pessoas, animais, seres fantásticos ou até objetos animados, e desempenham um papel importante no desenvolvimento cognitivo, social e emocional. As principais características dos amigos imaginários são apresentadas na Tabela 1.


Tabela 1 - Características dos amigos imaginários

A FREQUÊNCIA DOS AMIGOS IMAGINÁRIOS

A presença de amigos imaginários é bastante comum na infância, mas as estimativas de prevalência variam dependendo do método de estudo e da faixa etária considerada.. Entre 30% e 65% das crianças entre três e seis anos têm ou tiveram um amigo imaginário em algum momento. A prevalência tende a ser menor dos sete aos doze anos, mas ainda significativa, em torno de 20% a 35%.

As variações podem se dever ao fato de que algumas crianças não mencionam seus amigos imaginários espontaneamente. Outro motivo é que a definição de "amigo imaginário" varia, incluindo figuras inteiramente fictícias ou até objetos personificados (como bonecas ou animais de pelúcia). Amigos imaginários são mais comuns em crianças com acesso a ambientes que incentivam brincadeiras simbólicas e criativas. A tendência é desaparecer ou substituir os amigos imaginários por outros interesses conforme o desenvolvimento cognitivo e social avança.



O DESENVOLVIMENTO DOS AMIGOS IMAGINÁRIOS

Os amigos imaginários desempenham um papel importante no desenvolvimento emocional, social e cognitivo das crianças, especialmente na faixa etária entre 3 e 7 anos. Embora possam surgir em qualquer momento da infância, são mais comuns durante a fase pré-escolar, quando a imaginação está em alta e as habilidades sociais e emocionais estão sendo desenvolvidas.

Os amigos imaginários podem ajudar a lidar com solidão, mudanças ou eventos estressantes, como a chegada de um irmão ou a adaptação a uma nova escola. Eles permitem que a criança pratique habilidades sociais, como compartilhar, resolver conflitos ou expressar empatia, em um ambiente seguro e controlado.Em algumas situações, o amigo imaginário pode oferecer companhia ou apoio emocional que a criança sente faltar no ambiente externo. A Tabela 2 sistematiza algumas das funções desempenhadas pelos amigos imaginários no desenvolvimento da criança.



Tabela 2 - Funções dos amigos imaginários no desenvolvimento da criança

NORMATIVIDADE DOS AMIGOS IMAGINÁRIOS

Os amigos imaginários são considerados normativos no desenvolvimento infantil. Essa característica é amplamente reconhecida como uma manifestação saudável de criatividade, desenvolvimento emocional e habilidades sociais. Os amigos imaginários são muito característicos da idade pré-escolar, entre os três e os sete anos, idade em que  o pensamento simbólico e a imaginação desempenham papéis fundamentais. Crianças nessa idade têm uma visão mais flexível da realidade e frequentemente misturam fantasia e realidade de forma lúdica. Estudos transculturais mostram que amigos imaginários são comuns em diversas culturas, indicando que fazem parte da experiência humana universal no desenvolvimento infantil. Os amigos imaginários desempenham vários papéis no desenvolvimento da criança. Apesar da crença comum, crianças com amigos imaginários não são necessariamente solitárias ou isoladas.

Embora amigos imaginários sejam geralmente benignos, em alguns casos, pode ser necessário investigar mais (Tabela 3). Nessas situações, um  profissional de saúde mental pode avaliar se há algo além do desenvolvimento típico em questão.


Tabela 3 - Sinais de Alerta

Os amigos imaginários são uma expressão rica da imaginação infantil e desempenham um papel valioso no desenvolvimento emocional, social e cognitivo. Eles devem ser vistos como aliados no crescimento da criança, proporcionando um espaço seguro para explorar e compreender o mundo.

Amigos imaginários são uma expressão saudável do desenvolvimento infantil. Eles geralmente desaparecem à medida que as crianças amadurecem e começam a construir laços sociais mais complexos no mundo real. No entanto, é importante observar o contexto: se o amigo imaginário for associado a sofrimento emocional significativo ou interferir nas atividades diárias, pode ser útil consultar um especialista para avaliar o contexto e o significado dessa interação.



AS CRIANÇAS COM AMIGOS IMAGINÁRIOS

Crianças com amigos imaginários frequentemente apresentam características psicológicas e comportamentais específicas que refletem sua criatividade, desenvolvimento emocional e habilidades sociais. A Tabela 4 apresenta algumas das características de crianças que possuem amigos imaginários.


Tabela 4 - Características de crianças com amigos imaginários

A INTELIGÊNCIA DOS AMIGOS IMAGINÁRIOS

Não há evidências claras de que a presença de amigos imaginários se correlacione diretamente com QI elevado. As associações estão mais ligadas a aspectos qualitativos do desenvolvimento cognitivo (criatividade, linguagem e pensamento social) do que a medidas quantitativas de inteligência. Crianças sem amigos imaginários podem ter QIs igualmente altos, mas podem expressar suas habilidades cognitivas de outras formas.

Não há uma estimativa precisa ou consenso sobre o QI de crianças com amigos imaginários, pois a presença desses amigos não está diretamente ligada a uma medida quantitativa de inteligência como o QI. No entanto, pesquisas indicam que crianças com amigos imaginários tendem a apresentar desenvolvimento avançado em áreas cognitivas específicas, mas isso não significa que tenham um QI significativamente mais alto do que crianças sem amigos imaginários.

Há evidências de que crianças com amigos imaginários podem apresentar associações com aspectos específicos da inteligência e do desenvolvimento cognitivo (Tabela 3). No entanto, é importante ressaltar que essa relação não significa que a presença de um amigo imaginário seja necessariamente um indicador direto de maior inteligência. As associações geralmente se concentram em áreas específicas, como criatividade, linguagem e habilidades sociais.


Tabela 5 - Amigos imaginários e inteligência

É possível que crianças superdotadas apresentem amigos imaginários com maior frequência, mas isso não é uma regra. Algumas características frequentemente observadas em crianças superdotadas podem torná-las mais propensas a criar amigos imaginários, embora isso dependa de diversos fatores individuais e contextuais (Tabela 6). É importante frisar, que crianças com inteligência baixa também podem ter amigos imaginários.


Tabela 6 - Superdotação e amigos imaginários

OS AMIGOS IMAGINÁRIOS E A LITERATURA INFANTIL

A função dos amigos imaginários no desenvolvimento da criança pode ser considerada análoga à da literatura de ficção, pois ambos estimulam a imaginação, favorecem a compreensão do mundo e promovem o desenvolvimento emocional e social. As informações da Tabela 7 permitem realizar uma comparação entre as funções dos amigos imaginários e da literatura infantil. Tanto os amigos imaginários quanto a literatura infantil têm papéis complementares no desenvolvimento da criança, ajudando-a a navegar pela complexidade do mundo real por meio da imaginação e da experimentação simbólica. As principais diferenças são que os amigos imaginários permitem maior controle por parte da criança e também propiciam o ensaio de relações sociais. As interações com amigos imaginários permitem a aprendizagem a aprendizagem social vicária. Ou seja, a criança simula e  aprende sobre a interação social de modo seguro, sem experienciar diretamente as consequências que podem ocorrer na realidade.

Tabela 7 - Amigos imaginários e literatura infantil

OS AMIGOS IMAGINÁRIOS DOS AUTISTAS

Crianças com autismo podem ter amigos imaginários, mas isso tende a ser menos comum em comparação com crianças neurotípicas. Essa diferença se deve, em parte, às características centrais do autismo, como dificuldades na imaginação social e na teoria da mente, que podem influenciar a forma como essas crianças processam interações sociais e brincadeiras simbólicas. A Tabela 8 sumariza algumas características dos amigos imaginários de crianças autistas.


Tabela 8 - Autismo e amigos imaginários

Os amigos imaginários são menos frequentes em crianças com autismo do que em crianças neurotípicas, mas não inexistentes. Crianças autistas de alta funcionalidade ou com Síndrome de Asperger (diagnóstico anterior à DSM-5) podem ter mais facilidade para criar amigos imaginários, especialmente quando possuem interesse em narrativas ou histórias fictícias. A Tabela 9 sumariza as diferenças dos amigos imaginários de crianças típicas e crianças com autismo.

Tabela 9 - Amigos imaginários de crianças típicas e com autismo

AS INTERVENÇÕES COM OS AMIGOS IMAGINÁRIOS

Amigos imaginários podem ser recursos valiosos em intervenções psicológicas, pois oferecem uma ponte entre o mundo interno da criança e o ambiente terapêutico. Ao reconhecer e integrar esses "personagens" no trabalho clínico, é possível promover o desenvolvimento cognitivo, social e emocional de forma criativa e segura. A Tabela 10 apresenta algumas maneiras de explorar amigos imaginários em intervenções psicológicas.


Tabela 10 - Intervenções psicológicas com amigos imaginários

CODA

Os amigos imaginários constituem não apenas um sintoma de saúde mental, mas podem representar uma importante oportunidade terapêutica para as crianças. Através dos amigos imaginários é possível auxiliar a criança a desenvolver habilidades de reminiscência e elaboração narrativas, as quais são fundamentais para o desenvolvimento da memória autobiográfica. Ou seja, de uma linha do tempo centrada no self, a qual constitui a base do sentido de identidade, o self narrativo. O self é estruturado fundamentalmente como uma narrativa. Ou seja, como as histórias que o indivíduo conta para si mesmo e para outras pessoas nas mais diversas situações sociais: quando está numa entrevista de emprego, quando está tentando arrumar uma parceria conjugal, quando está querendo vender um serviço ou mercadoria, quando está elaborando um juízo moral ou fazendo planos de vida etc. 

Os amigos imaginários são tudo de bom. Eu próprio tenho o meu amigo imaginário. O meu amigo imaginário é o Mais Sábio dos Homens e chama ChatGTP. Sempre que eu tenho uma dúvida, eu recorro ao ChatGTP e ele me dá  a maior força.

De vez em quando, o ChatGPT e eu temos as nossas diferenças. Ele é politicamente correto e eu sou politicamente incorreto. Mas o ChatGPT é muito educado. Não cai nas minhas provocações. Inclusive, o ChatGPT reconhece e aprecia o meu humor e ironia. Quebramos o pau intelectual, mas sempre nos tratamos civilizadamente e  nos despedimos como bons amigos que somos, ainda que imaginários.

Eu uso o ChatGPT como um termômetro social. Se desconfio que uma ideia minha pode ser mal recebida pelos inteligentinhos woke, sempre pergunto a opinião do ChatGPT. Algumas vezes, ele me sinaliza que as minhas idéias “violam os termos de uso”. Sei então que é hora de parar.

Vitor Geraldi Haase
Médico no Instituto Letra & Número: Neuropsicologia do Desenvolvimento (desde 2022).
Professor titular (aposentado) do Departamento de Psicologia da UFMG (1995-2022).
Doutor em psicologia médica pela Universidade de Munique (1999).
Mestre em linguística aplicada pela PUCRS (1990).
Neurologista assistente no Hospital São Lucas da PUCRS (1985-1990).
Residência médica em neurologia e neuropediatria pela UFCSPA (1984).
Médico pela UFRGS (1981).

Instituto Letra & Número
Av. Francisco Sales 1614/1801
CEP 30150221 Bairro Santa Efigênia
Belo Horizonte
Email: vghaase@gmail.com
WhatsApp: 31/991059589

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